Cantar a duas, três ou mais vozes um repertório predominantemente modal, legado da sociedade agrária tradicional, é o modo de mulheres lutarem pela sustentabilidade da memória social no século XXI. Cantam em terceiras, quintas e, por vezes, em oitavas paralelas, num tempo que se distende à medida que entra cada uma das vozes, prolongando-se na suspensão final. Argumentam que o enlaçamento de vozes e vocálicos individuais é gerador de grande felicidade. No século XXI, estas mulheres detêm o conhecimento de um repertório, competências musicais e vocalidades que querem ver salvaguardados e reconhecidos. Querem partilhar e transmitir às gerações seguintes a experiência intersubjetiva e liminar do canto a vozes que reverbera nos seus corpos. Solicitaram a nossa colaboração para a inscrição desse conhecimento sensível no
Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial, com a expectativa de uma posterior inscrição na Lista da UNESCO. Criámos uma equipa, partimos para o terreno, e falámos com dezenas de cantadeiras, encorajando-as a ativar o “canto de mulheres”, como algumas gostam de lhe chamar. Quisemos saber como cantam e por que razão o fazem.
Partilhamos aqui alguns momentos desse encontro.